O que eu mais detesto nas datas festivas de fim de ano é o tradicionalismo medonho e a monotonia que se abate na sociedade em geral - além da proximidade do meu aniversário e, pior!, do Carnaval. Para qualquer lado que você olhe, ouve musiquinhas natalinas irritantes, vê pessoas se esfregando pela rua à procura de presentes cada vez mais baratos, shoppings lotados de retardatários, reportagens nada originais na TV...
É nessa monotonia que Rubem Fonseca ambienta o primeiro conto do livro Feliz ano novo. É no abismo social entre a classe burguesa e a marginalizada, entre a necessidade e a futilidade, entre a perspectiva de um réveillon feliz e farto, que o meu atual escritor brasileiro favorito faz um relato - por que não? - divertido e realista da própria natureza humana. No primeiro conto, homônimo, ele narra os planos de três assaltantes mortos de fome, que precisam catar comida de macumba para ter o que comer, para assaltar a mansão de "granfas". É a violência descrita como um meio de expressão, um grito de socorro. Na última história, "Intestino grosso", o autor descreve uma entrevista pingue-pongue, na qual o entrevistado parece ser ele mesmo. As perguntas e as respostas parecem ter sido uma compilação das entrevistas que Fonseca possivelmente concedeu ao longo de sua carreira. Sexo, pornografia, psicologia, erotismo, linguagem e literatura são alguns assuntos tratados no conto, ou seja, temas que permeiam a sua obra. São os dois contos que mais valem a pena ser lidos no livro lançado em outubro de 1975, que teve sua circulação e publicação proibidas em todo o território nacional pelo Departamento de Polícia Federal, sob a alegação de "exteriorizar matéria contrária à moral e aos bons costumes".
Das mesmas acusações sofreu Nelson Rodrigues, vinte anos antes, ao chocar a leitura do leitor mais conservador com os pecados e as tragédias da classe média carioca de então. Rubem Fonseca, assim como o jornalista precursor, surpreende ao narrar depravações, putarias, cenas de sexo explícito e assassinatos sem motivo. Para o senador Dinarte Mariz, em declaração publicada na Folha de S.Paulo de 1977, suspender Feliz ano novo foi pouco. "Quem escreveu aquilo deveria estar na cadeia e quem lhe deu guarida também. Bastaram meia dúzia de palavras. É uma coisa tão baixa que o público nem devia tomar conhecimento."
Para a cabeça dos conservadores, pode até ser. Mas para os liberais de hoje, e até mesmo para os daquela época, Feliz ano novo não é motivo para tanto estardalhaço. Excetuando-se alguns poucos textos, quem conhece o autor vai perceber que os protagonistas são crus demais, não ousam tanto e que o autor se mostra até muito bonzinho para o seu padrão. Por isso, destaco apenas os contos já supracitados, além das duas partes de "Passeio noturno", em que ele mostra seu sangue-frio perverso. A violência, o melhor recurso da obra de Rubem Fonseca tão presente em Feliz ano novo, é a tradução para a ficção da realidade que vemos todo dia na TV, do tradicionalismo e da monotonia em que a nossa tragédia coletiva e particular se insere.
Como relata Zuenir Ventura para a revista Visão, de 1975, "o que inquieta no livro é que esse mundo marginal distante se vai aos poucos revelando como nosso próprio mundo, onde os desvios são cada vez mais a norma".
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No décimo-quarto dia do ano (beeeem atrasada - eu estava trabalhando, gente!), venho aqui desejar um feliz ano-novo a vocês por aí que perdem de vez em quando (quase nunca) alguns minutos do dia pra ler meu blogzinho. hehe
Você, pelo visto, está sempre aqui. Pena que nunca tem paciência de nos dar o prazer de ler a sua opinião construtiva. Só chega pra esculachar. Se não gosta e/ou não tem nada de bom pra dizer, por que simplesmente não DESAPARECE? Juro que não fico chateada...
ResponderExcluirE outra informação para sua imensa sabedoria: só porque não há comentários, não quer dizer que as pessoas não leem. Além disso, eu escrevo pra mim mesma e não pros outros. Não estou interessada no ibope do blog, muito menos saber que ele anda (mal) frequentado por pessoas como vc. Esculachar pode, mas se identificar que é bom...
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